jun . 2024 .

Agricultura, logística, economia e sociedade: o que esperar quando as águas gaúchas baixarem

Impactos jamais vistos na economia nacional são um alerta do meio ambiente para um repensar das políticas públicas e privadas

Rodrigo Rodrigues e Vinicius Brum*

Agricultura, logística, economia e sociedade: o que esperar quando as águas gaúchas baixarem



É impossível ter passado alheio às notícias sobre as enchentes que afetaram grande parte do Rio Grande do Sul (RS). Chuvas só vistas antes na década de 1940 no estado voltaram a alastrar cidades inteiras, levando em enxurradas décadas de história e trabalho contínuo para construir uma das regiões mais influentes economicamente no Brasil, o que vem movimentando diversas esferas da sociedade em prol da contingência dos danos. Sob a responsabilidade dos prefeitos e do governador gaúcho, Eduardo Leite, em parceria com o governo federal, entidades não governamentais e o setor privado, é preciso reforçar e seguir rapidamente os planos de recuperação de forma ordenada.

O Rio Grande do Sul é responsável por 6,5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Metade desse percentual é representado por municípios que se encontram em situação de calamidade pública, de acordo com o instituto, o que reforça que ainda é cedo para visualizar os impactos no PIB.

Ainda assim, é possível ter uma prévia do que se pode esperar: comércio, serviço e indústrias foram afetados por conta das limitações logísticas na região gaúcha, que enfrenta dificuldades para escoar e receber produtos e insumos por conta das estradas destruídas, além de portos e aeroportos também acometidos. A Federação do Comércio de Bens e Serviços do Estado (Fecomércio-RS) divulgou recentemente que as perdas das empresas podem chegar a R$10 bilhões, com estoques, maquinário, mobiliário e instalações prejudicados. Ao menos 33 mil estabelecimentos foram atingidos, com queda dos ativos chegando a R$5 bilhões.

Em maio, o governo federal já havia elevado de 3,5% para 3,7% as estimativas para a inflação oficial do ano, aumentando, inclusive, a média para 2025, indo de 3,1% para 3,2%. Outros indicadores, como o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) também subiram.

Agricultura em risco

Ao passar pela agricultura, um dos principais pilares financeiros da região, espera-se uma queda superior a 4% na safra de trigo que estava para ser iniciada, além do impacto no que já havia sido colhido: perdas variando entre 1 milhão e 5 milhões de toneladas. Há relatos de silos que armazenavam colheitas de safras recentes que vieram abaixo, junto de milhares de metros quadrados de solo fértil. Fertilizantes estocados que seriam utilizados nos próximos plantios se perderam.

A Federação da Agricultura do RS (Farsul) estima um prejuízo de R$3 bilhões ligado a produção de grãos nas áreas alagadas. Vale ressaltar que o estado é responsável por 70% da produção nacional de arroz. O governo estadual informou ainda que ao menos 3.700 criadores de gado foram afetados.

Setor público na liderança pela recuperação

O setor público detém um papel fundamental na retomada das atividades normais da população e do setor produtivo do Rio Grande do Sul neste momento. Em conjunto, as esferas públicas e privadas se deparam com vários desafios a serem enfrentados.

Ações rápidas com responsáveis claramente definidos e a estruturação de um comitê de gestão de crise para uma governança eficaz dos trabalhos são iniciativas essenciais para um processo bem-sucedido após as tragédias. Podemos citar aqui algumas medidas que os governos devem priorizar para acelerar a recuperação social e econômica do estado:

  • Realizar uma avaliação completa dos danos causados pelas chuvas e enchentes e desenvolver um plano de recuperação que aborde as necessidades imediatas da população, de médio e de longo prazo das áreas.
  • Após as enchentes, já se observa o diagnóstico crescente de doenças transmitidas pela água. Por isso, é crucial implementar medidas emergenciais de saúde pública para prevenir surtos.
  • Definir ações logísticas e ambientais para lidar com o grande volume de detritos e resíduos gerados pela enchente, preparando o terreno para a reconstrução.
  • Priorizar a reconstrução de infraestrutura crítica, como estradas, pontes, escolas e hospitais, por exemplo, a fim de restaurar os serviços essenciais e facilitar a retomada das atividades econômicas e da rotina normal.
  • Implementar programas de empréstimos e subsídios para apoiar as empresas locais a se recuperarem, a retomarem a produção e a preservarem empregos. Incentivos fiscais de curto prazo e iniciativas de apoio ao consumo de produtos e serviços locais podem acelerar este processo.
  • Oferecer apoio social e psicológico às vítimas para ajudá-las a superar o trauma. Importante garantir que todos recebam abrigo, alimentos e cuidados médicos enquanto casas e comunidades são reconstruídas.

Desafios dessa magnitude requerem uma abordagem pragmática e coordenada entre diferentes níveis de governo e a participação da comunidade para uma recuperação eficaz e sustentável. Nestas circunstâncias, o poder público coleciona oportunidades para também discutir o futuro e elaborar um modelo de gestão mais proativo de riscos. É preciso pensar em formatos de prevenção e mitigação de desastres e na gestão das bacias hidrográficas, além de rever os modelos de planejamento urbano, o zoneamento nas cidades, os sistemas de drenagem e o manejo de águas em ambientes urbanos.

Temos o conhecimento e a capacidade para fazer muito mais pelas próximas gerações. Aplicar as lições aprendidas e entender as práticas bem-sucedidas de gestão de riscos adotadas por outras localidades no mundo permitirão a construção de um futuro mais resiliente e próspero para todos.

* Rodrigo Rodrigues é vice-presidente da Falconi para Soluções para o Agronegócio, e Vinicius Brum é vice-presidente da Falconi para Soluções para Saúde, Farma, Saneamento, Educação e Setor Público.

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